Estou passando por uma crise. Lendo
este artigo da
Mônica Montone publicado no blog dela, sobre a questão "
ter ou não ter filhos", vi muitas verdades, e infelizmente me identifiquei com algumas das palavras amargas.
Vou confessar aqui uma coisa que ninguém, além de mim, sabe:
eu QUIS ter um filho. Lembro que quando desconfiei da gravidez, na primeira consulta com a ginecologista, ela me disse:
"tu sabe né querida, nenhum bebê é gerado por acaso ou por descuido, bem lá no fundo do inconsciente sempre tem um desejo". No meu caso, nem era preciso ir tão a fundo. O desejo estava mais exposto do que se pode imaginar...
A verdade é que no mesmo momento em que eu finalmente conquistava minha tão sonhada liberdade (em 2006 eu consegui um bom emprego, saí da casa dos meus pais e mudei de cidade), minha mãe descobria um
câncer, já em estado avançado. Por mais que eu tivesse muitas desavenças com ela, a notícia veio como um soco na boca do estômago, abalando todas as minhas estruturas. No mesmo dia em que ela baixou hospital, com dores horríveis (horas depois a gente descobriria do que se tratava), nós tivemos um
briga feia. Daquelas que a gente perde o juízo, a razão, a noção, TUDO. Falei
ABSURDOS que eu não gosto nem de lembrar. Entre gritos e choros, até um allstar velho eu arremessei contra minha mãe. Dá pra acreditar? Na mesma noite ela teve que fazer uma cirurgia de emergência, ainda sem saber ao certo o que ela tinha. Suspeitava-se de apendicite (bom se fosse!!!), mas era um tumor de mais de 10cm no intestino. Minha mãe ficou internada 15 dias no hospital, por ironia do destino, NA ALA DA
MATERNIDADE (os outros quartos estavam lotados). Eu passei todos esses dias com ela, e durante todo tempo, não tocamos no assunto da briga. Era como se nada tivesse acontecido, mas o sentimento de CULPA que crescia dentro de mim, cresce até hoje.
Desde então, a família toda está unida nessa interminável maratona de cirurgias e quimioterapias. O câncer que começou no intestino, hoje já passou pro fígado. Os médicos são incansáveis e sempre surgem com um novo tratamento, mas todos sabemos que as alternativas estão acabando. Dói.
Dói muito.
Dói profundamente. E talvez a maior das dores seja esse SILÊNCIO. A incapacidade que eu tenho de poder dizer qualquer coisa pra minha mãe. Desde aquele fatídico dia, nunca mais brigamos. No máximo uma discussãozinha do tipo
"não me diga o que fazer, eu já sou grandinha". Inexplicavelmente, o meu medo de magoar ou fazer qualquer coisa ruim pra ela é tão grande quanto a minha
incapacidade de dizer "eu te amo". É óbvio que eu amo, eu só não consigo,
de jeito nenhum, dizer.
Foi aí que eu encontrei uma "solução". Com a descoberta da doença, minha mãe ficou muito chateada, claro, mas (com a ajuda e apoio de todos) logo deu um jeito de começar a viver da melhor forma possível. Ela mudou muito. Passou a se preocupar menos com coisas irrelevantes e dar mais valor a coisas que passam despercebidas. Passou também a pensar muito no futuro. Embora ninguém mais na família queira admitir, ela tem consciência da possibilidade de não ficar muito mais tempo entre nós. E então
ela tem pressa!!! Ela quer ver meu irmão numa boa faculdade (hoje ele tem 15 anos), ela quer que meu pai termine a pós-gradução, quer que eu me forme. Um dia ela comentou que queria me ver casada e com filhos.
Ela queria poder conhecer os netos. Numa situação normal, seria um comentário que entraria por um ouvido e sairia pelo outro, já que eu não pensava em ter marido e filhos tão cedo. Mas aquele pensamento ficou me acompanhando por muitas noites sem sono. Se tinha algo que eu pudesse fazer pela mãe, era isso. Um neto traria a alegria de volta pra ela. Um motivo a mais pra viver. Mas até então isso ainda era uma idéia absurda, afinal, eu não tinha nem um relacionamento estável.
Então eu conheci o Fred e na primeira semana nosso namorico já foi ficando mais sério. Eu conheci os pais dele e ele conheceu os meus. Nossa primeira relação sexual foi cuidadosa, tudo certinho, do jeito que a gente aprende na MTV.
Mas logo abandonamos a tal camisinha. Ele sabia que eu não estava tomando nenhum anticoncepcional, mas resolvemos arriscar mesmo assim. Não sei os motivos que levaram ele a isso (talvez o calor da hora, ou a confiança na tabelinha), mas
EU, no fundo, queria um bebê. Lógico que se fosse tipo
"Oi, Fred, quer ser pai do meu filho?" não ia rolar. Uma coisa mais
"nossa, aconteceu e agora?!" seria mais aceitável, inclusive pra mim, que ainda achava isso um devaneio. Que fique claro que eu não usei ele pra procriar!!! Eu apenas me atirei nas mãos do destino.
O que tivesse que ser, seria. E foi. Minha menstruação atrasou e só aí eu me dei conta do TAMANHO DA
(IR)RESPONSABILIDADE!!!! Uma criança estava a caminho. Um neto para a minha mãe.
No início foi um tremendo susto, e como relatei lá no primeiro post desse blog, eu custei a acreditar no palitinho
rosa.
Cheguei a pensar em aborto, sim. Mas no meio do turbilhão de emoções, eu fiz minha escolha. E pra mim, a maior prova de que algumas coisas não são por acaso: com 25% de chance de acontecer, meu filho nasceu com os olhos iguais aos da minha mãe.
AZUIS.
É aí que eu me identifico com este artigo aparentemente frio e insensível. Mesmo que (sub)inconscientemente, eu escolhi ter um filho pra satisfazer um desejo que nem era meu. Eu queria fazer minha mãe feliz, e esqueci de pensar no resto.
Esta é uma tarefa PRA QUEM PODE, e eu ainda não tenho a certeza de que eu posso.Meus dias têm sido difíceis. O Gabriel é um bebê muito calmo, saudável (nunca ficou nem resfriado) e simpático (adora conversar e rir). É quase um absurdo dizer que um anjo desses está me enlouquecendo!!
Mas creiam, está. Nos raros dias em que ele resolve ficar chatinho, ele me inferniza PRA VALER. E é nessas horas que eu vejo o quanto me falta paciência, dedicação e todas aquelas
coisinhas essenciais para ser uma boa mãe. Meu filho merece muito mais do que eu consigo dar.
Eu quis fazer uma pessoa feliz, e agora tenho medo de estar sacrificando outra por conta disso.